A ressaca
2011/10/18Colisão
2011/11/08Ruptura
O que há de pior no próximo orçamento? Nem sei por onde começar.
Talvez pelo mais óbvio: temos um orçamento para aprofundar a recessão em que o país mergulhou. Pergunto: um orçamento que nos atira ainda mais para o fundo pode ser coisa boa? No governo pensam que sim. Passos Coelho acha que o essencial é superar as metas da troika com distinção e antecipação. A troika previa uma quebra no produto de 2011 menor do que a que vai ocorrer e o mesmo filme se projecta para 2012. A razão é simples: o Governo está a ser mais troikista do que a troika.
Fixem este número: -2,8 por cento. Ele é falso. No próximo ano a economia portuguesa cairá 4 a 5 pontos. Por um lado, o próximo orçamento apoia-se numa estimativa muito generosa para as exportações. Sucede que os dois maiores clientes dos nossos produtos não se estão a dar bem. As previsões de crescimento para 2012 na Alemanha não chegam a 1 por cento e a Espanha promete regressar à recessão. Por outro lado, a compressão do poder de compra das famílias está a ser bem mais brutal do que o garrote desenhado pelos governadores de Bruxelas.
O aumento da jornada de trabalho não compensa o mau ano económico que aí vem. Por um lado, a medida de Passos Coelho carece, para existir, da aquiescência dos trabalhadores. A futura lei permitirá sem obrigar porque a carga horária é matéria de negociação colectiva. Por outro lado, o efeito económico é marginal. Com efeito, um acréscimo diário de meia hora gratuita reduz os custos totais da economia em 1,1 por cento. Na indústria transformadora – onde se concentram boa parte das empresas exportadoras – os salários são apenas 12,4 por cento dos custos de produção. O aumento previsto reduziria estes custos… em 0,8 por cento. Só empresários raivosos comprarão guerras por uma mão cheia de nada. Com efeito, o problema das nossas empresas não é o de terem trabalho a menos, mas o de estarem a funcionar abaixo da capacidade instalada.
Fixem agora outro número: 13,4 por cento, a projecção para o desemprego em 2012. É outra estimativa que peca por optimismo. O tecido empresarial português é extraordinariamente frágil. A par da crise de crédito, a quebra no consumo privado revelar-se-á fatal para a sobrevivência de dezenas de milhares de micro, pequenas e médias empresas. A este respeito, o fim do IVA intermédio na restauração e nos congelados, bem como o aumento do imposto sobre os combustíveis, terão um efeito adicional altamente destruidor. Lá para o fim de 2012 contem com 15 por cento de desemprego. Dir-me-ão que a Espanha está pior, com 22 por cento. Pois… mas aí o Estado social ainda providencia um subsídio de desemprego muitos pontos acima do nosso. O verdadeiro problema com que o país se vai confrontar em 2012 é o de uma ruptura social profunda. Gregos nos fazem, gregos nos terão.