Ruptura
2011/10/24Todos caem
2011/11/14Colisão
Que terá levado o primeiro-ministro grego a anunciar uma moção de confiança e um referendo ao pacote de medidas gregas aprovado no último Conselho Europeu? A hipótese mais plausível é a de que queira sacudir a dupla pressão a que está a ser sujeito – pela troika e pelo seu povo.
A primeira consequência do anúncio foi a entrada em queda livre dos títulos bancários pelas bolsas mundiais. O capital financeiro entrou literalmente em pânico ante a simples possibilidade de um povo ser chamado a decidir… sobre assuntos da sua vida e das suas contas. De onde é útil concluir: a democracia e a bolsa andam de candeias às avessas.
A segunda consequência do anúncio foi o de destruir o trabalhoso plano urdido pela cimeira. Foi chão que deu uvas e ponto. Ele deu dois dias de bolsas a subir, outro no assim-assim e ao quarto tudo se finou. Basta um primeiro-ministro de um país periférico anunciar um referendo para se esvaírem as reservas de confiança dos mercados financeiros? Ou é preciso que tal anúncio ocorra no contexto de um acordo mínimo entre líderes inaptos para as funções que ocupam?
Vá-se lá saber porquê, na semana passada a generalidade dos comentadores saudou as decisões da cimeira Merkozy. Que pela primeira vez o poder de fogo da UE estava à altura dos desafios, que o euro se tinha salvo in extremis e sei lá que mais. Tal avaliação não tem ponta por onde se pegue. As decisões do eixo franco-alemão são um arranjo, mais um, numa cadeia de más e péssimas decisões misturadas com quilómetros de indecisões.
Os governos reconheceram a necessidade de reestruturar a dívida grega depois de terem andado ano e meio a dizer que nunca o fariam. Mas não concluíram pelo perdão de 50 por cento dessa dívida. Com efeito, as perdas são voluntárias e não se concluíram as negociações sobre elas. O anúncio de Papandreou só pôs em questão o que estava colado com cuspo. Mesmo que tudo corresse pelo melhor, o impacto do ‘perdão’ seria de apenas 20 pontos no nível de endividamento do país. A Grécia continuaria sem qualquer horizonte de saída, até porque persiste a violência das medidas de austeridade que a condenam a uma prolongada recessão. Sobre o essencial, o Conselho nada disse. Decidiu, contudo, colocar a troika a viver em Atenas. Para qualquer grego com uma réstia de patriotismo na sua cabeça, esta medida é, em si mesmo, uma afronta.
Eles podem detestar o seu primeiro-ministro, mas nem por isso ficarão satisfeitos por o ver ir a despacho dos governadores nomeados pela capital do império. Com este tipo de provocações, a história só pode acabar mal.
Pior, só a declaração de Passos Coelho segundo a qual Portugal estaria agora mais longe de qualquer reestruturação da sua dívida. Está-se mesmo a ver, não está?