Todos caem
2011/11/14Greve geral
2011/11/28Soberania limitada
Na Grécia e na Itália chegou o tempo dos tecnocratas à cabeça dos governos. A eles compete a gestão do estado supremo das políticas de resgate, aquele em que os mercados assumem directamente o poder sobre as nações.
Nem Luca Papademos, nem Mario Monti foram a votos. Eles são simplesmente homens da banca alcandorados aos governos de países em crise.
Ambos vão governar passando por cima da convocação de eleições antecipadas. Com menos alarido e recebendo os elogios que são devidos aos salvadores de situações de calamidade, Papademos e Monti tornam realidade o sonho que Manuela Ferreira Leite confessou num dia de inusitada franqueza – o da suspensão da democracia por seis meses para resolver as dificuldades económicas do país.
Se na Grécia as eleições foram apenas adiadas, já em Itália Mario Monti alimenta a expectativa de concluir uma legislatura que vai até 2013. De ‘salvação nacional’, o seu governo mistura ‘técnicos’ do berlusconismo e ‘técnicos’ do centro-esquerda. O mix tem sido vivamente apoiado no exterior. Na verdade, é um Governo que coloca o Parlamento italiano ante um diktat muito simples – ou nós ou a escalada da especulação sobre a dívida ante um cenário de eleições antecipadas. A coisa parece funcionar… mesmo que a dita especulação tenha alegremente prosseguido depois da indigitação.
Puxo pela memória e recorro à história: nos anos 60, Leonid Brejnev, secretario-geral do então todo poderoso Partido Comunista da União Soviética, proclamou a sua doutrina da ‘soberania limitada’. Ela partia do princípio de que, se uma nação aliada ameaçasse trocar o socialismo pelo o capitalismo, isso constituiria um problema para toda a comunidade socialista. Assim se justificou a intervenção do Pacto de Varsóvia na Checoslováquia em 1968, para derrubar Dubcek, um comunista que procurava renovar e refundar o socialis- mo, conciliando-o com a democracia. Há quase 50 anos, Brejnev pôde impor a soberania limitada de uma forma grosseira, recorrendo a tropas e tanques.
Os tempos e os modos mudaram, os lugares também, mas não a doutrina. O que hoje se está a passar na Zona Euro cheira demais a soberania limitada. Os cínicos acham bem – quem empresta manda e ponto. Em nome desta inversão de legitimidade, a dupla de Merkel e Sarkozy já demitiu um governo que tinha acabado de vencer uma moção de confiança na noite anterior. Não contente, indicou o primeiro-ministro que lhe sucederia. Em Itália, despachou Berlusconi e indigitou Mario Monti para concluir o programa de ajuste… apresentado por Berlusconi.
Decididamente, o que antes se fazia com canhões resolve-se agora com spreads. Mas esta história vai acabar mal. Mesmo muito mal.