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2005/05/04HAMBURGO O ensino a duas vozes
NUMA ESCOLA PÚBLICA DE HAMBURGO, HÁ TURMAS MISTAS DE CRIANÇAS ALEMÃS E FILHOS DE IMIGRANTES PORTUGUESES. NOS PRIMEIROS 4 ANOS DE ESCOLARIDADE APRENDEM, AO MESMO TEMPO, EM ALEMÃO E PORTUGUÊS. A EXPERIÊNCIA RESULTA PARA TODOS E PODE SER GENERALIZADA.
A experiência começou há 5 anos, com apenas 12 alunos filhos de imigrantes portugueses. Hoje
são mais de 130, numa comunidade imigrante que terá, talvez, mil crianças a frequentar o ensino básico em toda a cidade de Hamburgo.
A experiência pedagógica da escola Rodolph Ross merece ser relatada: iniciou-se com uma turma mista de filhos de imigrantes portugueses e de alemães. Uns e outros aprendem, desde a primeira classe, não apenas alemão, mas também português. Não se trata do ensino do português como primeira língua estrangeira. Na realidade, é a “língua parceira” do alemão, porque o ensino de algumas disciplinas se faz, ao mesmo tempo, nas duas línguas. E com duas professoras, uma portuguesa e outra alemã.
Por causa da preparação de um relatório de iniciativa para o Parlamento Europeu – sobre a integração das comunidades imigrantes por via do sistema público de ensino – visitei este projecto pedagógico. Ao fim de quatro anos de escola, os miúdos não apenas entendem as duas línguas, como as escrevem. E, milagre, até os alemães se desenrascam num muito razoável português falado. Numa turma de 4ª classe, dialoguei com eles em português. As professoras introduziram o visitante na aula de Estudo do Meio falando ora em português ora em alemão. Os miúdos tinham perguntas escritas para me fazerem – em português. Um pouco adiante, passaram a espontâneas. Noutra turma, de 2º ano, uns trabalhavam em grupo, outros individualmente. A anarquia era apenas aparente. O método pedagógico que a escola segue é um sistema de estações com tarefas para serem executadas. Naquele dia, uns faziam umas, outros, outras. Nesta classe pude apreciar as vantagens de aulas orientadas por dois professores. O sistema permite um acompanhamento individualizado às diferentes tarefas que os miúdos têm pela frente e desenvolve extraordinariamente a responsabilidade e o poder de iniciativa. Eu gostava de ter aprendido naquela escola, apesar de não me queixar daquelas por onde passei…
O exemplo multiplica-se
Como a experiência correu bem nos dois primeiros anos, a novidade foi passando de família em família. Desde 2003, a escola tem aberto inscrições para duas turmas por ano, sob este método. Hoje, tem listas de espera… De todos os lados da cidade, há pais portugueses que se “viram” para colocar os seus filhos nesta escola pública. E cresce o interesse dos pais alemães, em particular os mais de maior formação, pelo projecto. Porque ele permite aos seus filhos a aprendizagem de uma terceira língua, para além do alemão e do inglês, na idade em que aprender línguas é muito mais simples.
Última inovação, a Rodolph Ross alargou entretanto ao segundo ciclo o projecto bilingue.
Algumas turmas do secundário (as que têm alunos vindos da Primária em ensino bilingue) têm a disciplina de português e ainda uma outra disciplina curricular é dada na nossa língua – o que estabelece um princípio de continuidade que consolida a formação bilingue.
O sistema público de ensino em Hamburgo, tem, além desta escola de “língua parceira”, outras seis que procuram responder a outras tantas comunidades imigrantes: a espanhola e turca (com 2 escolas cada) e ainda uma polaca e outra com filhos de italianos. Em todas elas, o principio da turma mista é defendido. É ele que eleva a auto-estima da segunda geração pela língua materna – porque contactam diariamente com miúdos alemães que também a estão a aprender. Periodicamente, as escolas encontram-se para monitorizar este método inovador que, de resto, não é incompatível com outras formas de promover as línguas maternas em terras distantes.