Debate do relatório do Deputado Vasco Graça Moura sobre o programa «Cultura 2007»
2005/10/24SOBRE A LIBERALIZAÇÃO DO COMÉRCIO E DOS SERVIÇOS
2005/11/06Sete notas sobre o Programa Cultura
Sessão plenária de 25 de Outubro de 2005
1. As dotações que a União tem destinado à Cultura sublinham o lugar que esta ocupa na construção europeia: uma nota de rodapé de página. Para o período de 2000 a 2006, a dotação foi de 236 milhões de euros, pouco mais de 35 milhões por ano. E antes disso, nem isso. A verba que a Comissão propõe para o novo período é de 408 milhões. Parece um grande aumento. Na realidade, é de apenas 14 por cento (ver exposição de motivos no Relatório).
2. O motivo para montantes tão baixos é que a Cultura se considera, nos Tratados, matéria de exclusiva competência dos estados Membros. À União compete apenas “cobrir” o que potencie a mobilidade de agentes e projectos culturais.
Mas – há sempre um mas – os responsáveis europeus repetem à exaustão frases bonitas como “não há Europa sem Cultura” ou, “a União é, acima de tudo, uma comunidade de valores e Cultura”. Desta contradição, resulta uma política: a Cultura apoiada pela EU deve ser, acima de tudo, “visível”. E dar “imagem” ao projecto político europeu.
3. Com recursos escassos, isto faz-se do único modo que é possível: apoiando “mega-projectos” e “grandes projectos”; e atribuindo subsídios directos, sem concurso, a algumas, poucas, dezenas de instituições. Esta a política que, em linhas gerais, a Comissão propõe que prossiga até 2013.
4. O Relatório de Vasco Graça Moura intervém sobre as duas variáveis da equação: a dotação mínima indispensável para o Programa; e a filosofia que lhe preside.
5. Onde a Comissão propunha uma dotação de 408 milhões de euros para sete anos, o Relatório opõe 600 milhões.
600 milhões de euros é muito pouco. Para se ter uma ideia, uma Conferência, “Sharing Cultures”, promovida no ano passado pela Fundação Europeia de Cultura, em paralelo a uma reunião europeia dos ministros da Cultura da União, considerava que a dotação necessária para este Programa se deveria situar em 315 milhões de euros… por ano.
E, como se sabe, os movimentos culturais têm-se batido, a nível nacional e europeu, por verbas destinadas à cultura que representem 70 cêntimos por habitante. Nada demais, portanto.
Mesmo que a verba fosse de 700 milhões, isso representaria um milésimo do Orçamento, aos valores actuais. Se a proposta de Graça Moura peca, é por defeito.
Fui solidário com a proposta, porque foi essa que vingou na Comissão de Cultura e Educação, contra aquilo que é a proposta da Comissão. Porque até esta “migalha” terá de ser arrancada ao Conselho dos primeiros-ministros da União. E também quero ver como acabarão os eurodeputados desta comissão por votar as Perspectivas Financeiras, se o montante que propuseram não vier a ser a opção final…
6. O Relatório cede à Comissão na sua intenção de entregar a gestão do Programa Cultura a uma entidade externa. E destina à essa gestão 8 por cento do seu próprio orçamento. É um absurdo. Até hoje tem sido a União a proceder à administração directa do programa Cultura. Tem as condições logísticas, recursos humanos e expertise para tal. E onde não tenha, pode arranjar… O Relatório, neste particular, apenas reduz de 8 para 6 por cento a margem para a gestão do Programa.
A ideologia dominante manda que tudo o que é público se faça em outsorcing. O argumento é o da eficiência e da poupança. Este caso demonstra exactamente o contrário. Mais de 30 milhões de euros são desviados para uma duplicação privada de funções. E, como é óbvio, a Comissão não desatará, por causa disso, a despedir funcionários…
Temos um programa cuja finalidade é exibir-se. E uma gestão que visa alimentar-se a si mesma…
7. Apesar disto, apoio o relatório porque ele entra em ruptura com a lógica que tem dominado a política cultural da União. O Relatório tem por objectivo o aumento da transparência na atribuição dos apoios, e a abertura a projectos de pequena e média dimensão.
Um exemplo para se perceber melhor:
A Comissão propõe que 33 por cento do orçamento se destine a apoiar projectos de 5 anos, co-financiados pela EU até 50 por cento. Estes projectos devem ser promovidos por um mínimo de 6 operadores de 6 países. Estas regras limitam drasticamente as possibilidades de candidatura, reservando-as exclusivamente a grandes operadores culturais que já funcionam em rede. É o monopólio de muito poucos.
Em alternativa, o Relatório sustenta que se podem candidatar projectos de 3 a 5 anos e de 6 operadores de 4 países, e que passe a ser possível a substituição de operadores durante a duração do projecto aprovado. Ao mesmo tempo, diminui de 33 por cento para 29 por cento, a dotação para esta linha de financiamento.
Esta mesma diferença acentua-se no apoio a projectos de 1 ano, que a Comissão entende que devem envolver 5 operadores de 5 países. O Relatório defende que esta linha apoie projectos até 2 anos; que os financie até 70 por cento; alarga os intervalos de montantes por projecto, quer para baixo, quer para cima; admite que eles possam ser propostos por apenas 3 operadores de 3 países; e o peso desta linha de financiamento subiria de 24 para 30 por cento.