Reconhecimento
2011/09/26A ressaca
2011/10/18Jangada de pedra
Pedi no facebook ideias para uma crónica – esta – sobre a Madeira e Alberto João Jardim, tendo em conta o folhetim em que se transformaram as dívidas da região. Pedi ainda alguma continência verbal, o que sabia antecipadamente não ser fácil porque a criatura inspira. Finalmente, escolhi um tema. «Das desconfianças de lá… às desconfianças de cá».
De onde vem a popularidade de Alberto João Jardim quando explora a identidade madeirense por oposição ao continente? Não existe disso nos Açores. Nem sequer entre minhotos e alentejanos. Será a arte de um homem? O José acha que não, que é história antiga: «É preciso conhecer os madeirenses, principalmente os mais idosos. Eles desconfiam genuinamente dos continentais devido a anos de ostracismo e de miséria».
O Raul confirma esse sentimento com uma história de família: «Quando me lembro que tinha uma tia relativamente instruída e viajada que, quando veio a Lisboa e adoeceu, se recusou a tratar-se por não confiar nos médicos do continente…». Com um exemplo destes, ninguém se atreve a duvidar. De qualquer modo, ostracismo e miséria não são exclusivos madeirenses. O mesmo Raul adianta outra hipótese. Ao contrário dos Açores, a Madeira teve uma classe de comerciantes ricos e uma influência inglesa forte, ambas ligadas à exportação do vinho da Madeira. Enquanto os Açores deram poetas, a Madeira teria produzido uma elite belicosa e ciosa da sua independência. Verdade? Perguntem ao cronista da página ao lado. Ele sabe disto bem mais do que eu.
Seja como for, a arrogância e a imprevisibilidade do ‘estilo Jardim’, popular na ilha, suscita no continente reacções que vão do gozo ao desdém. Contudo, a súbita descoberta do buraco financeiro da Madeira, que mete a um canto todos os «colossais desvios» invocados por Pedro Passos Coelho para ir a metade do subsídio de Natal, está a alterar a relativa bonomia destes olhares. Agora impera a pura e simples falta de paciência para a palhaçada. Quando escrevi no facebook «aceitam-se ideias», a primeira chegou célere: «Esse senhor só me lembra palavrões e asneiras». Amplificou o David: «Esse senhor ofende-me todos os dias na TV, chama-me analfabeto e ignorante sem me conhecer de lado nenhum». Para a Fátima, ele «é um mal agradecido». A Natália verbaliza o que muitos pensam – «e que tal a independência?» – enquanto a Manuela, na peugada da tragédia grega, sugere «que se venda a ilha à Arábia Saudita ou à China para amortizar a dívida soberana». «Alberto João seria o brinde», remata.
Este homem em fim de carreira criou um problema maior do que ele e que Portugal bem dispensaria. Depois do voto de domingo, a disputa sobre quem deve pagar não vai ter graça nenhuma. Porque, de um e de outro modo, é sempre o mexilhão que se lixa.