EUE
2011/09/12Jangada de pedra
2011/10/11Reconhecimento
O que Israel e os EUA mais temem no reconhecimento da Palestina é a cadeia de contradições que ele abre.
“Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão”
art. 7.º da Constituição
Escrevo esta crónica na semana em que a Autoridade Palestiniana solicitará formalmente à ONU o seu reconhecimento como Estado de pleno direito. Não sei se o fará em sede de Assembleia Geral, onde obterá seguramente mais de 2/3 dos votos, ou no Conselho de Segurança, onde os EUA usarão o veto para bloquear a iniciativa. Na primeira variante, os palestinianos obterão uma vitória diplomática, mas não o objectivo que se propõem – a aprovação da Assembleia Geral abre as portas à participação nos vários organismos da ONU, mas só tem poder consultivo. Pelo contrário, o Conselho de Segurança tem o atributo, mas basta o veto norte-americano para frustrar a vontade palestiniana.
A pressão sobre Mahmmud Abbas, Presidente da Autoridade Palestiniana, tem sido intensa. Com a subtileza que caracteriza a sua diplomacia, os norte-americanos ameaçaram pôr termo ao financiamento do orçamento palestiniano (500 milhões de dólares/ano). A chantagem nem sempre resulta, mas revela as dificuldades de Washington. Com efeito, Obama prometeu há exactamente um ano que em Setembro de 2011 a Palestina teria o seu Estado reconhecido. Vetar agora a sua própria promessa é algo que a parte mais fraca do conflito não esquecerá tão cedo. O uso do veto debilita definitivamente a posição de liderança que os EUA têm no quarteto responsável pelas negociações de paz. Em bom rigor, liquida-as.
Na verdade, o que Israel e os EUA mais temem no reconhecimento é a cadeia de contradições que ele abre. A partir daí, acções militares e actos de colonização nos territórios ocupados passariam a ser consideradas como agressões estrangeiras. É que a Palestina candidata-se com base nas fronteiras de 1967, as reconhecidas pelas Nações Unidas, beneficiando, aliás, do facto de Israel ser membro, mas, caso único, nunca ter entregue o mapa com as suas fronteiras…
Os EUA pressionam ainda a União Europeia e os aliados que têm no mundo árabe. Deste lado, não obterão grandes resultados. Mas já na Europa têm expectativas. Com efeito, a senhora Ashton encontra-se numa posição impossível. A UE está dividida, com a particularidade de os governos do Leste europeu, os mais atlantistas, terem tomado posição favorável ao reconhecimento. Quanto a Portugal, tem-se pronunciado por «uma posição europeia», forma delicada de dizer nada, ou seja, «tudo pela Palestina e nada contra Israel». Sugestão: e que tal se nos guiássemos pelo que está escrito na Constituição da República e que nenhuma revisão alterou? Que tal um Governo comprometido com a lei?