A Europa depois da França
2005/05/29Crise, evidência e esgotamento
2005/06/11A Europa dos plebeus
Editorial do GLOBAL
A eurolândia sofreu na Holanda novo revés.
O contraste não podia ser maior. Como em França, se o tratado tivesse sido ratificado pelo parlamento, teria 85 por cento de votos a favor.
Os resultados revelam a verdadeira dimensão da fractura entre a representação e a vontade popular.
O que se encontra por detrás deste divórcio político é uma fractura social exposta: a construção europeia assente no mercado e na livre concorrência chegou aos seus limites. E finou-se o arco social que a suportou.
Os analistas podem escrever que em França o resultado foi “francês”. Ou que na Holanda, os de cima se esqueceram que tinham um referendo pela frente. Podem. Como os eurocratas podem continuar a fingir que a França não existe, que a Holanda não conta, e que todas as ratificações devem prosseguir tranquilamente apesar de se saber que o Tratado, para entrar em vigor, carece da unanimidade dos 25.
Mas nada disso evita a constatação de que a ruptura entre “patrícios” e “plebeus” é brutal e incontornável. Esta é a forma e o modo da crise da política na Europa.
Gentilmente, os eleitores estão a avisar os líderes. De momento, dizem simplesmente: por uma vez, oicam-nos. E mostram-se. São os excluídos, os jovens e os assalariados.
Se os líderes persistirem no autismo, o que se segue não vai ser bonito de se ver.
……….
A 16 e 17 de Junho reúne-se o Conselho Europeu.
A agenda do conclave deveria ter um único ponto: emergência pela Europa; e um fio condutor: entender e traduzir os sinais da insubmissão que se expressa nas urnas.
Se for este o caminho, a Europa ganha. Se não for, os de cima continuarão a perder e no referendo britânico selam o seu destino.
Primeira decisão de bom senso: enterrar o Tratado.
Segunda decisão: abrir um debate sobre o futuro da Europa que possa concluir pela abertura de um processo constituinte democrático.
Terceira decisão: rever em alta as Perspectivas Financeiras para o período 2007/2013, enviando aos povos um sinal forte de vontade solidária na construção europeia.
Quarta decisão: arquivar as propostas de directivas que visam a liberalização dos serviços pela banda baixa dos direitos e prolongar os Horários de Trabalho para patamares asiáticos.
Quinta decisão: aproveitar os sinais que os mercados já estão a enviar ao euro, para colocar a política monetária ao serviço da retoma das economias.
Sexta decisão: enterrar o acordo que viabilizou uma falsa revisão do Pacto de Estabilidade.
Se forem por aqui, provarão que, por uma vez, foram capazes de ouvir.
O europeismo de esquerda ganhou nas urnas uma nova responsabilidade. Nos próximos meses deve ser capaz de construir uma alternativa de projecto à Europa das políticas liberais. E deve fazê-lo alargando o campo do não e estimulando a participação dos múltiplos activismos que se encontraram neste combate por uma refundação democrática e social da Europa.